João Almeida e o futuro

Foto: Getty Images
Como conheceu o João Almeida e como reconheceu o seu talento?
A coisa interessante é que o João Almeida originalmente foi-me recomendado pelo Matxin. Quer dizer, a primeira pessoa que me falou do João Almeida foi o José Poeira, mas a seguir a ele foi o Matxin. É muito interessante que eu, embora não viva em Portugal, tenha conhecido um ciclista português quando ele ainda era júnior, por outras pessoas. O João é um caso muito único, é um ciclista que tem uma calma fora do normal e uma boa educação. Também tem uma vida familiar muito estável, que lhe dá muita tranquilidade, e eu tenho fé que ele vai continuar a dar-nos muitas alegrias, como portugueses. É uma pessoa que tem sido muito importante para meter o ciclismo português no topo do ciclismo mundial, que é onde ele está hoje.
João Correia
À data da realização desta entrevista, João Almeida ainda não tinha feito pódio no Giro d’Italia, cimentando o lugar de Portugal nas proximidades desse topo e claro, enchendo os adeptos portugueses de orgulho. Porém, as afirmações de João Correia mantêm-se atuais e neste aspeto, começa-se a notar um padrão: sempre que questionado sobre um ciclista, Correia destaca primeiramente as suas competências psicológicas, visão que se reflete no scouting, que faz parte do seu trabalho enquanto agente.
Como funciona o scouting no ciclismo? Como se nota a habilidade e a mentalidade de um ciclista, observando apenas algumas corridas?
O resultado é uma coisa importante, não é? Um ciclista ter resultados é muito importante. Mas a coisa mais importante é a atitude, a mentalidade; conseguires ver se o atleta tem a possibilidade de ultrapassar os vários obstáculos que lhe vão ser metidos à frente. Há muitos ciclistas que são muito bons em juniores ou cadetes, ou mesmo em sub-23 e até nos primeiros anos de profissionais, mas não quer dizer que vão ter uma grande carreira. Porque a coisa mais importante é a mentalidade deles. Fora do talento que têm que ter, têm que ter uma mentalidade muito aberta e têm que ter um senso de trabalho muito bom.
João Correia
Sabendo agora como funciona o processo pelo qual se identifica a qualidade de um ciclista, regressamos ao “caso único” de João Almeida:
O João sempre foi um miúdo muito reservado. É um daqueles miúdos que tu nunca davas conta dele, porque se o visses num grupo de 5 pessoas, ele nunca estava mais à frente. Mas ele sempre conseguiu ultrapassar os vários obstáculos que teve, e ele teve obstáculos muito difíceis, especialmente no início, quando foi correr para a Itália. Ele conseguiu ultrapassar esses obstáculos e pronto, vai criando as coisas de dia para dia.
João Correia

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Já falámos do passado (ainda muito presente), com Rui Costa. Já falámos do presente, com João Almeida. Podemos falar do futuro, com António Morgado?
O António tem um bigode melhor que o do João (risos). É um ciclista que está a começar o plano e a carreira dele. Ainda é muito cedo para perceber exatamente onde o António vai chegar, embora ele tenha grande potencial e eu tenho esperança que ele vá chegar muito longe. É um miúdo muito particular, está a crescer numa geração completamente diferente mesmo daquela onde o João cresceu, mas tem muita oportunidade pela frente e vamos ver o que vai conseguir fazer com essa oportunidade, que é a coisa mais importante.
João Correia
O ciclismo mudou, na forma como é percecionado pelo público português, e António Morgado pode ser o primeiro reflexo dessa mudança, cujos efeitos não se fazem sentir de imediato. Quando questionado sobre o destino de Morgado, João Correia transporta, para cima da mesa, a mesma calma e paciência que considera muito importantes nos ciclistas.
O destino dele é como os outros: fazer este percurso pela Axeon, passar a profissional e depois vemos o que ele consegue fazer. É muito fácil nós olharmos para um ciclista que está a ter bons resultados ou tem muito talento e pensar ‘este daqui a 3, 4, 10 anos vai ser um grande’, mas há muitos que deviam ter sido e nunca foram. Mas eu tenho esperança que o António vai conseguir ultrapassar as dificuldades que todos os atletas têm. Esse é o nosso trabalho, ajudá-los a tomar boas decisões, a continuarem focados no hoje, trabalhar hoje, fazer as coisas corretas hoje, dia a dia, assim se faz uma carreira.
João Correia
A qualidade de António Morgado explica que o fascínio pelo ciclista não pare de aumentar, mas é nesta circunstância que o papel de João Correia se torna mais importante:
Não há nenhuma equipa no World Tour que não adorava ter o António […]. Ele tem muita oportunidade à frente e às vezes teres muita oportunidade torna as coisas mais difíceis.
João Correia