Matteo Jorgenson through the eyes of a friend – English Version
Matteo Jorgenson lidera o Paris-Nice. O ciclista da Team Visma-Lease a Bike pode não ser o mais forte na ‘Corrida do Sol’, mas é definitivamente o mais consistente. Após o contrarrelógio por equipas que o colocou na liderança, perdeu terreno no topo da montanha da etapa 4. No entanto, recuperou no muro da etapa 5 e desferiu um duro golpe nas aspirações de João Almeida na etapa 6, aproveitando o vento para ganhar muito tempo. Agora, está na ‘pole position’ para repetir a vitória do ano passado.
Poucos imaginavam que um dia veriam Jorgenson a este nível. Foi a vitória no Paris-Nice do ano passado que o fez reavaliar os seus objetivos de carreira, apontando à vitória numa grande volta. Não será este ano, pois recusou a liderança da Visma-Lease a Bike no Giro d’Italia. Ainda assim, espera tornar-se forte o suficiente para incomodar Tadej Pogacar e ajudar Jonas Vingegaard a vencer o Tour de France.
O duelo com João Almeida no Paris-Nice despertou a curiosidade dos fãs portugueses. Quem é este ciclista? De onde veio? Como é que se tornou num dos melhores do mundo? A Portuguese Cycling Magazine tenta responder a todas as questões neste artigo, com a ajuda de Keegan Swirbul, ciclista da Efapel e amigo de longa data de Matteo Jorgenson.

Matteo Jorgenson sabe coisas
Ao descrever a sua relação com Matteo Jorgenson, Keegan Swirbul começa com um sorriso: “O Matteo e eu fomos colegas de equipa em 2018. Divertimo-nos muito juntos. É uma pena que não tenha passado tanto tempo com ele como gostaria, porque ele pode definitivamente ser um amigo para a vida.”
Na equipa Jelly Belly, os dois americanos fizeram muitas corridas e inúmeros treinos juntos. Apesar disso, Swirbul nunca imaginou que o seu amigo chegasse ao nível atual: “Eu sabia que ele era bom, mas não o via como ‘meu Deus, este tipo vai ser um possível vencedor de grandes voltas um dia’.” Recorda-se de ele ser “uma promessa decente”, mas ofuscada por talentos como Brandon McNulty, que está atualmente a 3:05 minutos na classificação geral.
Embora Jorgenson não fosse uma grande promessa, ele demonstrava algumas qualidades acima da média. “Lembro-me dele na primeira etapa de uma Colorado Classic, com um circuito muito técnico ao estilo europeu – sinuoso, cheio de curvas, estreito. Aos 18 anos, tinha uma capacidade inacreditável de flutuar pelo pelotão e posicionar-se na frente!” Em contrapartida, Swirbul perdeu tempo nessa etapa, quando era um dos líderes da equipa e Jorgenson era gregário.
A capacidade de se posicionar revela, para além de uma técnica apurada, muita inteligência. De facto, Matteo Jorgenson parece ter sempre sabido coisas que os outros ciclistas precisam de aprender. “Sabe treinar e sabe encontrar os melhores profissionais para o ajudar. Não se importa com gastar dinheiro. Gastou muito do seu próprio dinheiro para fazer coisas que ajudaram a sua performance, e sabe exatamente o que tem de fazer, o tipo de marca de alimentos que tem de comprar e todos os equipamentos.”
Para saber tantas coisas, é preciso ser inteligente, e Swirbul confirma: “O Matteo é realmente inteligente. É incrivelmente disciplinado e tem um motor bestial. Mas demorou anos para que víssemos esse motor, porque teve de ultrapassar alguns obstáculos.”
So that’s a wrap on my best spring ever🌼
— Matteo Jorgenson (@MatteoJorg) May 2, 2023
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A receita da Europa
Então, que obstáculos teve Jorgenson de ultrapassar? Na sua inteligência, o ciclista natural de Idaho evitou logo um grande obstáculo no seu caminho, que é o “grande erro” que muitos ciclistas americanos cometem: permanecer nos EUA e apontar às corridas nacionais por demasiado tempo. “Quero ir para lá, habituar-me a viver na Europa como sub-23, para que quando der o salto para profissional, esteja habituado e não seja um choque”, o seu raciocínio resumido.
A caminho de um bom resultado no Rhône-Alpes Isère Tour em 2018, Jorgenson lançou um ataque. Conversou com diretores desportivos de equipas francesas em busca de uma oportunidade de correr na Europa. Não foi fácil nem aconteceu de imediato, mas acabou por ter a oportunidade que procurava na equipa jovem da [Decathlon] AG2R La Mondiale.
“Este era o único caminho dele para a Europa”, garante Keegan Swirbul. Não é que Jorgenson não pudesse ter acabado na Axeon, mas de acordo com Swirbul, a equipa Axel Merckx teria contribuído pouco para o seu desenvolvimento. Como a estrutura não está concentrada num local, os ciclistas nem sequer precisam de sair de casa dos pais para se juntarem a ela. Por isso, embora possa ser uma ótima experiência para jovens como João Almeida, Rúben Guerreiro e os gémeos Oliveira, isso não se aplica aos seus equivalentes americanos, que permanecem afastados do coração do ciclismo.
Se entrar na Europa já era um desafio, permanecer lá levou o jovem norte-americano ao limite. Swirbul, que comunicou com Jorgenson durante este período, descreve uma cultura “fechada” no ciclismo francês. Mas Matteo conhecia “a receita para fazer da Europa a sua casa”. O ingrediente principal era aprender francês, para não “ficar infeliz porque ninguém falava com ele.” Assim fez e isso “permitiu-lhe mostrar os seus talentos como ciclista”. Meses depois, estava na equipa profissional da AG2R. Um ano depois, assinou o seu primeiro contrato profissional com a Movistar Team.

Sempre na frente
Desde aquele circuito técnico do Colorado, Keegan Swirbul suspeitava que Matteo Jorgenson poderia dar-se bem nas Clássicas. Um dos seus primeiros resultados notáveis foi na Milano-Sanremo, ainda pela Movistar. E no ano passado, com a Visma-Lease a Bike, venceu a Dwars door Vlaanderen e depois teve uma excelente prestação na Ronde van Vlaanderen.
“O que ele faz, não há outro ciclista para além do Pogacar que o faça”, afirma Swirbul. “Em todos os momentos críticos de uma corrida, o Matteo está no top-5 do pelotão.” De facto, os adeptos de ciclismo têm notado as skills de Jorgenson durante o Paris-Nice. Enquanto os seus adversários já perderam tempo por não conseguirem a melhor posição, o norte-americano está sempre na frente.
A liderança de Jorgenson na ‘Corrida do Sol’, juntamente com resultados como o 2º lugar no Criterium du Dauphiné e o 8º lugar no Tour de France, mostram que está cada vez melhor na montanha. Mas a explicação para este desenvolvimento é mais simples: “Se tens um motor daqueles, és um corredor de gerais. É assim que funciona.” E refletindo sobre o que o seu antigo colega tem alcançado, Keegan só pode considera-lo “absolutamente espetacular”.
Muitos acreditam que Matteo Jorgenson é um dos ciclistas mais motivados do World Tour para treinar. Mas naturalmente que o seu treino evoluiu desde que bateu a essa porta pela primeira vez. “Quando estava na Movistar, treinava de forma muito diferente do que faz agora. Ele fez muito treino de tempo, o que é muito cansativo e pode funcionar durante um período, mas paga-se a conta mais tarde na época.” É por isso que os resultados de Jorgenson caíam sempre a partir de maio, com exceção de 2023, onde brilhou no Tour.
Dentro da Visma-Lease a Bike, os ciclistas não estão autorizados a divulgar os números dos seus treinos. Ainda assim, tendo falado com Jorgenson várias vezes sobre o seu método atual, Swirbul descobriu que “é sobre mitigar a fadiga o mais possível durante a temporada”. É este tipo de treino que permite a Jorgenson estar forte tanto nas Clássicas como no Tour, ajudando os líderes Wout Van Aert e Jonas Vingegaard em busca dos seus objetivos.
Grandes no Japão
“Quando fomos ao Japão, eu ainda lhe ganhava nas subidas. Hoje em dia, ele rebentava comigo em qualquer montanha”, aponta Keegan Swirbul. Recuando no tempo, surgem mais memórias na cabeça do ciclista de 29 anos. Naquele 2018, houve Utah, onde ficou em 7º, depois Colorado, onde Jorgenson dominou aquele circuito e, para terminar a temporada, iriam correr o Tour de Hokkaido, no Japão.
“O Matteo e eu estávamos em grande forma depois do Utah e do Colorado, e estávamos muito entusiasmados para correr. Saímos no dia antes da corrida para fazer a nossa abertura [já no Japão]. Corremos a subir uma montanha, sprintei contra ele e venci-o… É isto que quero dizer. Ninguém sabia que ele seria um concorrente do Tour de France!” Swirbul ri-se de como as coisas mudaram.
Apesar de um percurso mais acidentado, com muitas lesões e problemas de saúde, as pernas continuam lá. Keegan também deixou os Estados Unidos e, tal como Matteo aprendeu francês, fala espanhol no nível C1. Atualmente corre pela Efapel Cycling, onde contribuiu para o arranque positivo da equipa portuguesa na temporada. Sente-se aculturado na Europa e não faz planos para regressar aos EUA.
Certamente que aqueles dois rapazes em viagem por Hokkaido não poderiam imaginar as voltas e reviravoltas que iriam acontecer nas suas vidas. E eles temerem pelas suas vidas sob o luar dede Hokkaido. “Acordámos a meio da noite e o prédio estava a tremer” Um forte sismo atingiu a ilha nipónica e 41 pessoas perderam tragicamente a vida…
Na manhã seguinte, Keegan e Matteo acordaram com “o caos nas ruas” e foram informados de que a corrida tinha sido cancelada. Recuperando do grande susto, perceberam que estavam vivos e bem. E quando te sentes vivo, segues em frente e vives a tua vida ao máximo. “O Matteo e eu saímos e treinámos. Passeios incríveis, subidas rápidas e esforço máximo durante sete horas. Essa é a minha memória favorita com ele”, conclui Swirbul.