Cai o pano na Taça do Mundo de Ciclocrosse. A última prova da temporada teve lugar em Besançon, no Este de França, e serviu para cumprir calendário, já que as contas da classificação geral da competição para os escalões Elite foram já fechadas na semana passada, em Benidorm. No entanto, muitos dos participantes na prova gaulesa poderiam não concordar com esta afirmação, já que este é o último teste antes dos Campeonatos do Mundo de Hoogerheide, e muitos quereriam utilizá-lo para aferir o seu real estado de forma, além da motivação extra que seria dada para enfrentar a derradeira semana de preparação no caso de um bom resultado hoje.
Naquela que é considerada a cidade mais verde de França, é esta cor que sobressai no circuito da prova. Construído num parque desportivo da cidade, a relva é o elemento predominante deste traçado, e é praticamente sobre este piso, com alguma terra à mistura, que os ciclocrossistas vão pedalar, o que por si só não traz acrescida dificuldade, até porque não estaria prevista chuva. No entanto, e tirando proveito da experiência de Francis Mourey (que ajudou na planificação deste circuito), a organização conseguiu encontrar algumas armadilhas que fazem os ciclistas puxar dos galões. É um percurso rápido, mas com bastante serpenteado, onde poder-se-á apontar várias zonas técnicas, com inclinações curtas e acentuadas, misturadas com curvas e contracurvas. No início de cada volta, os ciclistas dão de caras com uma pump track, bem ao estilo do BMX, e ainda na primeira metade da pista podem encontrar-se algumas secções mais retas e pedaláveis, que permitem aumentar a velocidade. A meio do percurso existe uma subida em gravilha, e as escadarias presentes no circuito, uma delas relativamente longa, também são um obstáculo complicado, que gradualmente vai acrescentando desgaste à medida que as voltas vão acumulando.
Já com as camisolas da liderança da Taça do Mundo entregues a Laurens Sweeck (Crelan-Fristads) e Fem Van Empel (Jumbo-Visma), muitos ciclocrossistas optaram por não se deslocar a França, e isso foi mais evidente no lado feminino. Com a ausência das principais estrelas nas mulheres, incluindo a própria Van Empel, o absoluto favoritismo para hoje recaía nos pedais de Puck Pieterse (Alpecin-Deceuninck). A neerlandesa tinha aqui uma excelente oportunidade para erguer pela primeira vez os braços como campeã nacional, e levar a quarta vitória na Taça do Mundo para casa. A maior luta poderia ser dada por nomes como Silvia Persico (FAS Airport Services), que fez uma excelente prova em Benidorm, Annemarie Worst (777) ou mesmo Denise Betsema (Pauwels Sauzen-Bingoal), que esteve ontem em Hamme. Ainda, a jovem Zoe Bäckstedt (EF Education-TIBCO-SVB) poderia aqui ter uma palavra forte a dizer no que ao pódio diz respeito.
No lado masculino, o grande favorito seria Mathieu Van der Poel (Alpecin-Deceuninck), que teria toda a vontade em responder à vitória categórica de ontem de Wout Van Aert (Jumbo-Visma) em Hamme. De assinalar também que esta seria a última prova que os irmãos Van der Poel correriam juntos, e logo em França, país natal do avô Raymond Poulidor e da mãe, portanto uma vitória hoje estaria carregada de simbolismo. A principal oposição estaria certamente a cargo de Sweeck, o já matematicamente vencedor da Taça do Mundo, e de Eli Iserbyt (Pauwels Sauzen-Bingoal), apesar da sua condição física poder não ser a melhor, depois de ter participado ontem na prova do Troféu X2O de Hamme e da respetiva viagem até França.
Elite Feminino
Como previsto, o total favoritismo de Pieterse parecia confirmar-se logo desde o tiro de partida, com um arranque forte e decidido da neerlandesa, que a colocou de imediato no comando da corrida. Mas o destino quis apimentar um pouco mais a corrida de Pieterse, e ainda na primeira volta, um problema na corrente fez a ciclista da Alpecin-Deceuninck perder cerca de 25 segundos para a cabeceira. Na frente, um grupo de cinco corredoras, liderado por Worst, tentou aproveitar este percalço, mas Pieterse estava vários patamares acima de todas as outras, e nem uma volta depois já se tinha juntado novamente à frente da corrida.
Pouco depois, já dentro da terceira volta, com o ritmo elevado que trazia, Pieterse aproveitou para lançar um forte ataque, partindo em solitário para o que restava cumprir da totalidade das cinco voltas. Atrás, a perseguição ficava a cargo das colegas de equipa Worst e Inga Van der Heijden (777) que, paulatinamente, viam a vantagem de Pieterse aumentar.
Com 45:21 minutos cumpridos de corrida, Pieterse cruzava a linha de meta, numa demonstração de força que deixa os adeptos a salivar pelos Campeonatos do Mundo da próxima semana. A segunda classificada foi Worst, a 37 segundos, e a sua colega Van der Heijden chegaria seis segundos depois, a 43 de Puck. A jovem Bäckstedt fez também uma excelente corrida, terminando no 4º lugar, a 1:02 da vencedora.
Na classificação geral da Taça do Mundo, ficou tudo na mesma, com a vitória de Van Empel na edição 2022/2023, com um total de 395 pontos. Pieterse arrecadou a 2º posição, a apenas 5 pontos de Van Empel, e Shirin Van Anrooij (Baloise Trek Lions) ficou-se pelo 3º posto, com 264 pontos.
Elite Masculino
Na corrida masculina, foi notório o pouco que estava em jogo no dia de hoje. O ritmo de passeio que se registou nas três voltas iniciais permitiu a ciclistas como Clément Venturini (AG2R Citroën Team), Joris Nieuwenhuis (Baloise Trek Lions) e Kevin Kuhn (Tormans Cyclo Cross Team) assumir por largos metros o ritmo da corrida, com um grupo constituído por cerca de uma dúzia de elementos a iniciar a quarta volta ainda junto.
Durante este tempo, Van der Poel foi aquecendo os motores para, a cinco voltas do final, lançar um ataque portentoso que não deu hipótese a mais ninguém. Em algumas centenas de metros, o neerlandês abriu um espaço de 10 segundos para o restante grupo de nove ciclistas, que, surpreendentemente, se manteve impávido e sereno, como se de uma corrida à parte se tratasse. E talvez fosse.
Em cada uma das voltas seguintes, a subida em gravilha foi palco de várias tentativas de ataque no conjunto perseguidor, primeiro por Venturini, depois por Sweeck, e também Kuhn tentou a sua sorte, mas a tarefa de fazer desunir o grupo aparentava ser hercúlea. Tudo se estaria a guardar para a última volta, quando um ataque de Iserbyt apenas levou na roda Sweeck. Mas o azar bateu à porta do ciclista da Pauwels Sauzen-Bingoal, com um problema na corrente, escancarando o segundo lugar a Sweeck. Atrás, a discussão pelo último lugar do pódio era travada ao limite entre Nieuwenhuis, Venturini, Niels Vandeputte (Alpecin-Deceuninck) e Ryan Kamp (Pauwels Sauzen-Bingoal).
Alheio a toda esta luta estava Van der Poel, que cumpriu as nove voltas ao circuito primeiro que toda a gente, ao fim de 1:01:33 h. A segunda posição foi mesmo para Sweeck, a 49 segundos, e Nieuwenhuis foi quem conseguiu arrecadar o terceiro posto, a 52 segundos, naquele que foi o seu primeiro pódio em provas da Taça do Mundo desta temporada.
Um curiosidade do desfecho da corrida de Besançon prende-se com o facto de Toon Vandebosch (Alpecin-Deceuninck), por ter terminado a prova na 13ª posição, ter “atirado” Van Aert para a segunda linha da grelha nos Campeonatos do Mundo da próxima semana.
As contas finais da Taça do Mundo confirmam, oficialmente, Sweeck como vencedor da presente edição, com 385 pontos, seguido de Michael Vanthourenhout (Pauwels Sauzen-Bingoal), com 309 pontos e de Iserbyt, com 290 pontos.