O Tour de l’Avenir
No Tour de l’Avenir, como é que o contrarrelógio por equipas, que foi muito prejudicial para o México, afetou o Isaac?
Eles perderam 3 minutos e 40 segundos, mas felizmente [a organização] implementa uma regra que limita as perdas a 2 minutos. Eu tinha reuniões diárias com o Isaac para discutir as táticas e no dia anterior disse-lhe: ‘A realidade é que vais perder mais de 2 minutos, porque algumas equipas são muito fortes, enquanto nós temos falta de equipamento e nunca treinámos contrarrelógio por equipas. O que eu recomendo é que faças uma gestão do teu esforço, porque é preferível não desperdiçar energia para os próximos dias. Sim, vai ser difícil recuperar esses 2 minutos, mas acredito que ainda és capaz de vencer o Avenir.’ Ele ficou bastante calmo: ‘Ok, vou fazer isso e recuperaremos o tempo’.
Assim sendo, o Isaac começou a recuperar tempo e na Etapa 6, foi mesmo o melhor. Como viveste esse dia e quão importante foste para ele (segundo ele)?
Quando ele ficou em 2º lugar [Etapa 4], vimo-lo atacar a 15 quilómetros do fim e o pelotão não conseguiu alcançá-lo, apenas o ciclista suíço que o bateu na linha de meta. Mas eu vi os números de potência dele e disse: ‘Isaac, vais fazer um ótimo Tour de l’Avenir’. Temos algum tempo para recuperar e o Col de la Loze é uma subida muito difícil, que se torna ainda mais dura nos últimos 7 quilómetros. Há a Loze na sexta-feira, depois no sábado o contrarrelógio e a etapa B, depois outra etapa difícil no domingo, por isso não tentes recuperar todo o tempo na sexta, ainda tens mais três etapas pela frente’.
A grande capacidade de subida de um ciclista de pouco serve sem a aprendizagem sobre como gerir o próprio esforço. E Freddy Cruz tentou sempre incutir essa inteligência em del Toro, através das táticas que lhe foi transmitindo por mensagem.
Portanto, a tática era atacar entre 5 a 3 quilómetros da linha de chegada, porque aí a inclinação está constantemente entre 16% e 20%. Ele ia fazer um esforço de 30/40 minutos, estando 15/20 minutos [só nessa secção], por isso não queria queimá-lo a atacar antes. Ele atacou exatamente a 4 quilómetros do fim. Foi aí que soube que ele ia estar lá em cima e ele ganhou confiança [com o ataque], por isso conseguiu e recuperou muito tempo.
Após vencer no Col de la Loze, o Isaac experiencou sensações mistas no contarrelógio da Etapa 7a. O que o fez perder tempo nessa manhã?
No contrarrelógio ele cometeu um grande erro, por isso é que perdeu os 46 segundos para o Matthew Riccitello. O Isaac não se estava a sentir bem nesse dia, se bem que já estavam todos cansados. Ele fez o aquecimento protocolar, eu tirei algumas notas e quando ele subiu para os rolos e aqueceu durante 15 minutos, disse: ‘Estou a ficar cansado’. Saiu dos rolos e dirigiu-se para a linha de partida, onde ficou sentado durante 20 minutos sem fazer nada, e depois começou desta forma. A pressão e os nervos entraram na cabeça dele, foi esse o erro. Eu disse-lhe: ‘Ainda temos hipótese, Isaac. Tens mais duas etapas para recuperar este tempo’. Então, disse-lhe para atacar na subida antes da meta [na etapa da tarde], apenas para testar as pernas dos adversários. Ele estava a sentir-se bem e conseguiu ganhar confiança. Atacou a 4 quilómetros do final e recuperou cerca de 20 segundos para o Riccitello.
Foi também neste ponto que algumas mudanças começaram a tornar-se evidentes, nomeadamente o facto de alguns ciclistas se recusarem a colaborar com o Isaac durante o seu ataque na Etapa 7b. Como é que um ciclista pode lidar com esta situação de corrida?
Depende da situação da corrida. No sábado, quando o Isaac atacou, um ciclista italiano [Giulio Pellizzari] foi com ele e não quis cooperar, porque estava em 5º lugar na classificação geral e o seu colega de equipa estava em 2º. E o Isaac e os italianos até são amigos, apostaram até uma pizza e um gelado que iam ganhar uns aos outros no Avenir (risos)! Aquilo eram táticas de corrida, mas então porque é que o Isaac continuou a levar o italiano na roda? Porque ele só estava a pensar em vencer a classificação geral. Desde que o Isaac atacou, a única missão dele era recuperar tempo para o Riccitello. Então, nessa situação, não podia fazer mais.
No contexto da busca da camisola amarela por parte de Isaac del Toro, a questão torna-se de resolução simples. Contudo, o exemplo do dia seguinte mostra o quão depressa as coisas podem mudar.
Na última etapa, ele entrou numa boa fuga com o Giulio Pellizaari, o Archie Ryan e outros ciclistas do top-10. Estavam todos a colaborar, mas depois alguns abrandaram porque estavam cansados e o Isaac estava a ir muito forte. Portanto, ele continuou a puxar e a deixá-los para trás um a um. O único ciclista que ficou com o Isaac foi o italiano, que o ajudou desta vez porque já era do seu interesse passar do 4º para o 2º lugar. Tornaram-se aliados. Logo, depende da situação da corrida. O Isaac só estava a pensar em vencer o Avenir, por isso procurou a vitória e foi por ela.
Voltando um pouco atrás na Etapa 8, como é que tu e o Isaac planearam o ataque vitorioso? E depois, como celebraste essa grande vitória?
Bem, ele estava a 54 segundos do líder e eu disse-lhe: ‘Esta é uma etapa para matar ou ser morto. Obviamente, se vais atacar, fá-lo no momento certo, mas acho que podes fazê-lo longe da meta’. Então ele atacou a 50 quilómetros do fim e o resto é história: abriu mais de 2 minutos para o Riccitello e conseguiu a vitória.
História para o México! Isaac Del Toro conquista o Tour de l’Avenir, juntando o seu nome a uma lista de vencedores onde estão também Nairo Quintana, Egan Bernal e Tadej Pogačar. Naturalmente, não só para Freddy Cruz como para todos os adeptos mexicanos, este foi um momento inesquecível.
Tenho alguns dias na minha vida que recordo como sendo os melhores. Um deles foi quando a Garmin me ofereceu o contrato, exatamente no meu aniversário, 2 de agosto de 2010, e lembro-me muito bem desse dia. Agora, eu e alguns amigos meus fizemos um treino de bicicleta e acabámos a ver a etapa num café. Assim que ele terminou, saí do café e comecei a chorar. Não conseguia acreditar, naquele momento. Depois comecei a receber chamadas dos meus pais, do meu irmão… e continuei a chorar, nem conseguia falar, foi realmente incrível!